quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

"Em sã consciência podemos com o pensamento estar além de nós mesmos. Por meio de um lúcido esforço da mente podemos nos manter à distância das ações e suas conseqüências; e todas as coisas, boas e más, passam por nós como uma torrente. Não estamos integralmente envolvidos na natureza. Tanto posso ser um pedaço de madeira flutuando à deriva da corrente, quanto Indra no céu contemplando-o da altura. Posso ficar impressionado com um espetáculo de teatro e, por outro lado, não me comover com um acontecimento real que parece muito mais dizer-me respeito. Só me conheço como entidade humana, o palco, por assim dizer, de pensamentos e emoções; e sou consciente de certa duplicidade pela qual posso ficar tão distante de mim mesmo quanto de qualquer outra pessoa. Por mais intensa que seja a minha experiência, estou cônscio da presença e da crítica de uma parte de mim, que, como se não me pertencesse, fosse um espectador sem nenhuma participação na experiência, apenas anotando-a; e essa parte de mim não é mais eu do que é vós. Quando chega ao fim a comédia ou, quem sabe, a tragédia da vida, o espectador vai-se embora. Até onde lhe dizia respeito foi uma espécie de ficção, uma simples obra de imaginação."

(Walden, H. D. Thoreau)

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

O meio e as massagens

De tanto ouvir as expressões "aldeia global" e "o meio é a mensagem", de Marshall McLuhan, acabei, num atitude absolutamente estúpida de minha parte, me cansando por antecipação de qualquer coisa que ele pudesse me dizer.
Hoje, lendo finalmente seu livro The medium is the massage, vejo o quanto estava perdendo de ideias realmente revolucionárias, para além das expressões e jargões "ambientalizados" no jornalismo.
Seguem trechos do livro:

O poeta, o artista, o detetive - quem quer que aguce nossa capacidade de perceber tende a ser anti-social; raramente "bem ajustados", não podem seguir as correntes e tendências. Um estranho vínculo existe entre os tipos anti-sociais por sua capacidade de "ver" os meios ambientais como eles realmente são. Essa necessidade de contrapor, de confrontar os meios ambientais com uma certa força anti-social, é manifesta na famosa história "As Novas Roupas do Rei". Os cortesãos "bem-ajustados", por terem interesses a defender, viam o Rei belamente ataviado. O fedelho "anti-social", não condicionado pelo antigo meio ambiental, viu claramente que o Rei estava nu. O novo meio ambiental era claramente visível para ele.

*
amador

"Minha educação foi a mais comum possível, consistindo em pouco mais que os rudimentos de leitura, escrita e aritmética de uma escola igual às outras. Minhas horas fora da escola eu passava nas ruas ou em casa."
Michael Faraday, que pouco conhecia de matemática e quase não tinha instrução formal além da escola primária, é famoso como um experimentador que descobriu a eletricidade induzida. Foi um dos fundadores da moderna física. E é geralmente reconhecido que o fato de Faraday ignorar matemática contribuiu para sua inspiração, e o compeliu a desenvolver um conceito simples e não-matemático enquanto procurava explicação para seus fenômenos elétricos e magnéticos. Faraday possuía duas qualidades que compensavam com sobras sua falta de instrução: uma intuição fantástica e independência e originalidade mentais.
O profissionalismo é ambiental. O amadorismo é anti-ambiental. O profissionalismo funde o indivídulo em padrões de total acomodação ambiental. O amadorismo procura o desenvolvimento da consciência total do indivíduo e a consciência crítica das regras básicas da sociedade. O amador pode dar-se ao luxo de perder. O profissional tende a classificar e especializar, a aceitar sem crítica as regras básicas da sociedade. As regras básicas fornecidas pela reação de massa de seus colegas servem como meio ambiente penetrante do quel ele extrai satisfação sem dele ter consciência. O "especialista" é o homem que fica parado.

"Há crianças brincando nas ruas que poderiam resolver alguns dos meus mais complexos problemas de física, porque elas possuem maneiras de percepção sensorial que perdi há muito tempo." (J. Robert Oppenheimer)

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Poesia em imagens






























































































































Nova York, A vida na grande cidade
Will Eisner

sábado, 16 de outubro de 2010

Distrações

Meu trabalho de conclusão de concurso (o famigerado tcc) é uma monografia sobre jornalismo em quadrinhos, a partir da obra de Joe Sacco.
Pesquisando algumas coisas na internet, acabei me distraindo. Mas acredito que tenho uma boa justificativa, afinal ler o trabalho do Sacco e conhecer o artista-cartunista-jornalista me parece muito mais atraente do que devanear sobre questões de gênero jornalístico...
Enfim, pelo menos, essa é a vantagem de estudar um tema desses... a gente sempre pode se distrair com o próprio trabalho...

O vídeo com uma apresentação de Sacco é longo e é em inglês, sem legenda. Mas pra quem se interessa por quadrinhos e/ou jornalismo (e/ou pessoas interessantes, que, por sinal, não se acham nada interessantes, mas têm coisas realmente interessantes para falar), vale muito a pena. Uma verdadeira aula! Ou melhor, uma ótima distração!


E, por falar em distração, por causa do Sacco (sinceramente, ele não me deixa trabalhar!), acabei descobrindo um blog que é um verdadeiro deleite: Dois Espressos!
"Notas sobre livros, música, artes visuais, gastronomia, gadgets, blogs, wanderlust e café espresso". Com uma apresentação dessas, acompanhada de duas xícaras de café fumegante, foi paixão à primeira vista!
Adorei a ideia das listas de leituras, ilustradas por fotografias de pilhas de livros. E eu, que adoro listas e livros, já ia longe, longe... do meu trabalho.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

A santa apaixonada

Na conversa entre Cíntia Moscovich e Maria Valéria Rezende, surgiu o assunto dos escritores com mais de dois nomes. Teriam sucesso ou reconhecimento? A brincadeira e a resposta a um amigo estavam num texto de Maria Valéria. Carlos Drummond de Andrade e João Guimarães Rosa eram apenas alguns exemplos de que, sim, escritores com mais de dois nomes poderiam se tornar reconhecidos.

A lista incluía Rosa Amanda Strausz. Desconhecia a autora, mas o título do livro mencionado me era familiar: Teresa, a santa apaixonada.
Não que tivesse lido, mas tinha em casa um exemplar da minha irmã (Rosa também), que sempre se interessou por Teresa de Ávila, ou Teresa de Jesus. Nunca havia me despertado interesse especial, a não ser pela curiosidade de conhecer a vida de uma santa. Mas a Cíntia e a Maria Valéria falavam não apenas da santa, mas do livro da Rosa contar a história da Teresa escritora.

Foi neste momento que o Senhor lhe disse:
"Não te aflijas, eu te darei um livro vivo."

O livro vivo é uma das mais belas imagens do misticismo cristão. É o livro da experiência interior. Como se fosse uma obra encantada, se expressa de maneira diferente para cada leitor/autor, mas suas páginas contam apenas uma história: a da porta de comunicação que liga cada alma a Deus.

Seu tomo invisível se constrói a cada dia. Muda, se aperfeiçoa. Receber o livro vivo das mãos de Sua Majestade significa transformar a própria vida em obra. Nessa biblioteca incorpórea e infinita, homens, mulheres, intelectuais, conversos, cristãos-velhos, nobres e pobres estão unidos em um só texto: o das criaturas que transformam o amor divino em palavras.


Buscando a escritora, encontrei a alumbrada, que vivia sob o signo da paixão a busca pelo amor divino. A monja carmelita que ousou travar uma amizade com Deus, numa época em que a figura predominante era a do Pai que julga e pune. A santa que, por meio do silêncio, da entrega e do desapego, conseguiu realizar seu desejo de união.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Adoniran, uma biografia

Primeiro, conheci o autor. Depois, a obra. Celso de Campos Jr. veio a Santos para participar da segunda edição da Tarrafa Literária. Dividindo a mesa "A vida dos outros", com o jornalista Guilherme Fiuza, autor de Bussunda, a vida do Casseta e Meu nome não é Johnny, Celso falou sobre Adoniran, uma biografia.
A entrevista sobre o evento rompeu o que se podia esperar como barreira, talvez mais alimentada pelos próprios leitores do que pelos escritores. O contato ali, ao alcance da mão e da conversa, com uma pessoa de carne osso, responsável por um trabalho monumental, dessacralizava qualquer imagem, tornava real. A simplicidade do autor parecia destoar da grandiosidade da obra. Mas era isso mesmo. A pessoa falando do casamento de sexta-feira, a vinda pra Santos, o futebol de sábado à tarde e as mordomias do festival, era a mesma que tinha escrito a história da vida de ninguém menos que Adoniran Barbosa.
Só consegui ler o livro após o término da Tarrafa, e, apesar de pensar que teria aproveitado muito mais o evento se tivesse lido antes, posso me consolar acreditando que talvez aproveitei muito mais a leitura depois do festival. Relembrei histórias da vida do artista contadas no palco e descobri muitas outras - histórias que revelaram um Adoniran desconhecido e, ao mesmo tempo, recriaram a figura do Adoniran com que cresci.
Logo que iniciou a venda de compact disc no Brasil, ter o aparelho e álbuns era raridade. Quando finalmente a novidade chegou à minha casa, no início dos anos 90, o número de cds que possuíamos não ultrapassava dez. Entre eles, havia um álbum dos Demônios da Garoa. Já conhecia algumas músicas, mas não me cansava de ouvir e me divertir com a sonoridade e a letra de canções como Samba Italiano, As Mariposa e Samba do Arnesto. Não lembro se já associava o grupo à figura de Adoniran. O primeiro contato consciente com o artista (digo consciente, porque, no borrão da memória, recordo de festas de família com Trem das Onze ao fundo) veio com a novela Sassaricando. Tiro ao Álvaro, gravada com Adoniran e Elis Regina, compunha a trilha sonora. "De tanto levá frechada do teu olhar, meu peito até parece sabe o quê? Táubua de tiro ao Álvaro. Não tem mais onde furá." Aos meus ouvidos infantis, a letra soava como um misto de poesia e brincadeira de criança.
Cristalizou-se aí a imagem do artista brincalhão. Depois veio a do artista boêmio. E com a maturidade, a do grande cantor e compositor. Agora, após ler o trabalho do Celso, o meu Adoniran cresceu. Continua sendo o brincalhão, o boêmio, o cronista musical. Mas é mais. Muito mais.




(Programa Ensaio, ou MPB Especial, da TV Cultura, gravado em 1972)

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Saudades da Tarrafa

Cinco dias de discussões literárias. Autores nacionais e internacionais dividindo mesas e a atenção do público. Em sua segunda edição, a Tarrafa Literária vai se consolidando como um dos principais eventos culturais de Santos.
Mas não vou reproduzir aqui a cobertura jornalística do festival. Na verdade, este é o texto de alguém que já sente saudade de algo que acabou de acabar e procura apenas reter o que fica quando a Tarrafa termina.
Antes de mais nada, fica o choque da volta à realidade. Passar alguns dias ouvindo pessoas criativas e interessantes falar de seus trabalhos igualmente criativos e interessantes com tanta naturalidade e, ao mesmo tempo, despretensão, é capaz de nos transportar para uma espécie de paraíso de ideias novas. Saímos do lugar-comum, em mais de um sentido. Voltar para a nossa pequena vida diária nos faz questionar se o que estamos fazendo é realmente o melhor de nós mesmos e cria em nós o desejo brutal de sair das nossas zonas de conforto, ou conformismo, e superar a própria mediocridade.
Fica o vestígio do contato com ideias e pessoas incríveis. Prosaicas até, de tão humanas, e por isso mesmo, deliciosas. Como o gosto de Zuenir Ventura por meias coloridas e os dois beijinhos cariocas. A timidez de Luís Fernando Veríssimo e os seus textos que não são seus. As confissões dolorosas e engraçadas de Cintia Moscovich. A história do sagüi da infância de Maria Valéria Rezende. O humor e a sinceridade escrachada de Angeli ("Tem horas que eu me arrasto na incompetência") e Allan Sieber ("Na vida real, eu sou um merda. A minha resposta, eu dou nos quadrinhos"). O professor André Rittes, superstar. A mãe do Celso de Campos Jr. garantindo a fonte e a vida do Guilherme Fiuza desmoronando em meio a um trabalho. A confusão da Nina Horta com a tradução inglês-português, sua aversão à relação sensual com a comida, a naturalidade com que disse que nunca havia falado em público antes, a defesa da simplicidade. E a expressão extasiada do Mark Crick ouvindo a Nina falar. Jeremy Mercer e a graça com a abobrinha e as imagens de flores, Zeca Baleiro e a graça com a abobrinha e as florzinhas, e a risada contagiante de Matthew Shirts.
Ficam os encontros, as conversas de corredor. As aventuras e a cumplicidade com a Juliana, nós duas divididas entre a diversão e a obrigação (mas como é mesmo que se faz uma matéria de tv?). Nossa saudade antecipada.
Fica a espera pela próxima Tarrafa Literária.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Comer, rezar, amar

Sim, é um best-seller. Não, não tem nenhuma complexidade literária.
É apenas a história da jornalista Elizabeth Gilbert que, recém-divorciada e em crise existencial, decide passar uns tempos viajando pela Itália, Índia e Indonésia.
Em cada um destes destinos, uma aprendizagem: o prazer por meio da comida, a devoção, o amor.
O que era para ser trivial e simplista consegue se tornar interessante. A busca de si mesma como descoberta de Deus. Ou a busca de Deus e a descoberta de si mesma.

A maioria de nós, mesmo que apenas por dois minutos de nossas vidas, vivenciou em algum momento uma sensação inexplicável e completa de total contentamento, em nada relacionada ao que acontecia no mundo externo. Em um instante, você é apenas uma pessoa normal, arrastando-se por sua vida mundana, e então, de repente — o que é isso? — nada mudou, e, no entanto, você se sente tocado pela graça, inflado de assombro, transbordante de felicidade. Tudo - absolutamente sem nenhum motivo — está perfeito. É claro que, para a maioria de nós, esse estado passa com a mesma rapidez com que chegou. É quase como se lhe mostrassem sua perfeição interior para provocá-lo, e em seguida você cai de volta na "realidade" muito depressa, desabando encolhido outra vez por cima de todas as suas antigas preocupações e desejos. Ao longo dos séculos, as pessoas tentaram se agarrar a esse estado de perfeição e contentamento por meio de todo tipo de recurso externo - drogas, sexo, poder, adrenalina, acúmulo de coisas sem importância -, mas ele não se mantém. Nós buscamos a felicidade por toda parte, mas somos como o mendigo da fábula de Tolstoi, que passou a vida sentado em cima de um pote de dinheiro, mendigando centavos de todos os passantes, sem saber que sua fortuna estava bem debaixo dele o tempo todo. O seu tesouro - a sua perfeição - já está dentro de você. Porém, para acessá-lo, você precisa deixar para trás o frenesi da mente e abandonar os desejos do ego, e adentrar o silêncio do coração.

(Essa passagem pode fazer parecer se tratar de um livro de auto-ajuda, mas na verdade, está mais ligado às tradições orientais de reconhecer a divindade do Ser em cada ser)

O filme estrelado por Julia Roberts também promete.



Eddie Vedder, sempre garantindo belas trilhas sonoras.



Better Days
(Eddie Vedder)

I feel part of the universe
open up to meet me
my emotion so submerged
broken down to kneeling
what's listening?
voices they care
had to somehow greet myself
greet myself
heard vibrations within my cells
in my cells
singin' laaa
my love is saved for the universe
see me now I'm bursting
on one planet so many turns
different worlds
singin' haaa
fill my heart with discipline
put there for the teaching
in my head see clouds of stairs
help me as I'm reaching
the future's paved with better days
night runnin' from something
I'm running towards the day wide awake
all whispered once quiet
now rising to a scream right in me
I'm fallin'
free fallin'
world's calling me up off my knees
oh, I'm soaring
yeah, and darling
you'll be the one that I can need and still be free
our future's paved with better days

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Yoga pela Paz

O que um bando de "malucos", cantando mantras, inventando cirandas e dividindo uma manhã de domingo de sol e chuva, tem que nos faz tão bem? Talvez não tenha explicação, e, se tivesse, talvez não teria tanta Graça. Isso é Yoga pela Paz.
O nome do evento não é vão. Uma manhã no Parque do Ibirapuera é suficiente para nos resgastar de nós mesmos e nos levar de volta para aquele lugar em nós em que somos paz, serenidade, bem-aventurança e amor.
A manhã era de vento e frio, o parque gelado. A esperança de sol tentava aquecer. Nathália e Elaine duvidavam. Pessoas mais que especiais dividindo momentos especiais. Um breve passeio. Mais frio. De repente a música. Jai Uttal. Somos o som. A aula da professoa Núbia Teixeira e a sensação real da presença divina em nós e em tudo e todos ao nosso redor. Somos uma árvore. A meditação da Márcia de Luca e o exercício de perdão. Somos o lago. Krishna Das. A companhia de pessoas queridas, o reencontro com pessoas queridas, a lembrança de pessoas queridas. Somos Amor.
O dia não foi de mágica nem de encantamento. Foi de Realidade. De encontro com a real natureza do nosso Ser.
Namastê, o Deus que habita em mim saúda o Deus que habita em você.
Agradeço a Nathália, a Di, a Ana Cristina, a Iva, o Seu Paulo, pai da Nathália, a minha mãe, o Seu José, e a todos os "malucos" no parque, por um dia perfeito!

sábado, 14 de agosto de 2010

Aforismo


"O riso é o início da oração"

(Rubem Alves, na Bienal do Livro, em São Paulo)

domingo, 8 de agosto de 2010

Filosofia de vida


"Um homem é rico em proporção ao número de coisas de que pode prescindir." (Thoreau)

Não gosto muito da expressão "filosofia de vida", talvez por acreditar que ela não faça jus nem à filosofia, nem à vida, ou como se viver seguindo uma (ou crer que se vive de acordo com uma) fosse uma dessas ilusões que usamos para dar significado à existência. Uma bobagem, assim como "ter uma ideologia". Mas encontrei um caso, ou melhor, três, em que a expressão fez sentido pra mim. Na natureza selvagem, o filme. Into the wild, a trilha sonora. Thoreau, a inspiração.
O filme narra a história real de Christopher McCandless, que abandona tudo ao terminar a faculdade, para viver na natureza, seguindo um estilo de vida pouco usual, em nada ditado pelos padrões sociais. No caminho de desprendimento, ele se torna Alexander Supertramp. Dirigido por Sean Penn, o filme é dividido em fases que correspondem à trajetória de iluminação de McCandless/Supertramp. Surpreendente, intrigante, transformador. É praticamente impossível sair ileso ou não ser tocado em pelo menos uma ideia na teia embolorada de nossas mentes. Na natureza selvagem é um desses "filmes de cabeceira" que nos acompanha ao longo da vida, caso a nossa alma não envelheça.


A trilha sonora de Eddie Vedder é igualmente iluminadora. A sonoridade é deliciosa e emoldura a narrativa de modo perfeito. Letras como "Society, you're a crazy breed, hope you're not lonely without me" (Society), "I'll take this soul that's inside me now like a brand new friend I'll forever know" (Long Nights), "On bended knee is no way to be free" (Guaranteed), traduzem em forma de música a filosofia vivida por Christopher. A lista se completa com Setting Forth, No Ceiling, Far Behind, Rise, Tuolumme, Hard Sun, The Wolf e End of the Road. A trilha, mais um caminho de iluminação.


Henry David Thoreau (1817-1862) é um propragador dos ideais anarquistas (nesse sentido, vale a pena ler Desobediência Civil) e precursor da geração beatnik e do movimento hippie, defendendo princípios libertários, o desapego à sociedade e suas normas, e a vida simples na natureza. Absolutamente iluminador. É um dos autores que inspiram McCandless/ Supertramp. Walden, o livro que não o abandona. Na natureza selvagem é uma verdadeira materialização de suas ideias.

"Fui para os bosques porque pretendia viver deliberadamente, defrontar-me apenas com os fatos essenciais da vida, e ver se podia aprender o que tinha a me ensinar, em vez de descobrir à hora da morte que não tinha vivido. Não desejava viver o que não era vida, a vida sendo tão maravilhosa, nem desejava praticar a resignação, a menos que fosse de todo necessária. Queria viver em profundidade e sugar toda a medula da vida, viver tão vigorosa e espartanamente a ponto de pôr em debandada tudo que não fosse vida, deixando o espaço limpo e raso; encurralá-la num beco sem saída, reduzindo-a a seus elementos mais primários, e, se esta se revelasse mesquinha, adentrar-me então em sua total e genuína mesquinhez e proclamá-la ao mundo; e se fosse sublime, sabê-lo por experiência, e ser capaz de explicar tudo isso na próxima digressão." (Walden)

(Dedico essa postagem a três amigos: Vinícius, a primeira pessoa a me falar do filme e leitor antigo de Thoreau; André Rolim, por me lembrar do filme e me indicar outros também; e Igor, por ter me emprestado o filme e dividir comigo o interesse por essa "filosofia".)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Penso, logo existo?


quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Meditação

Experiência da professora de yoga Nicole Rodrigues, em um retiro Zen Budista

Não foram 4 dias maravilhosos. Não foram. Foram dias áridos, secos e de muitos, mas muitos mesmo, diálogos internos. Eu comi o pão que Buda amassou.No Zen Budismo não se faz meditação. Se faz zazen. Zazen, literalmente, significa sentar Zen.
(...) A nossa mente é uma coisa. Tão complexa, tão intrincada, que será eternamente objeto de estudo da ciência. Somos seres condicionados. Desde sempre condicionados. Viciados em pensar. Viciados em pensamentos dicotômicos. Isso é feio, isso é bonito, ela é inteligente, ela é burra, ele é gordo, ele é magro, estou triste, estou alegre, minha vida é boa, minha vida é ruim, eu queria ser assim, mas eu não sou assim, eu queria que minha vida fosse assim, eu queria que minha vida fosse assado, a escola dela tem mais alunos que a minha, portanto a escola dela é melhor que a minha, ela sabe isso, ela sabe aquilo, eu não sei isso, eu não sei aquilo, eu sou virginiana, ela é sagitariana, virginiano é uma mala sem alça, sagitariano é tudo de bom, meu emprego tá ruim, meu emprego tá bom, hoje tá frio, hoje está quente, meu zazen tá ruim, meu zazen tá bom, estou com pouco dinheiro, estou com muito dinheiro, se eu tivesse feito isso eu teria mudado minha vida, se eu tivesse falado aquilo naquela hora, se isso, se aquilo, se não isso, se não aquilo se se se se se sesesesesese blá blá blá aaahhh. É uma forma de pensar exaustiva. Somos grandes auto-sabotadores. Todos os três dias de retiro eu pensei: "Hoje eu vou embora. Vou dizer para Sensei que minha mãe ligou ou dizer que aconteceu um imprevisto e terei que sair antes, isso, aconteceu um imprevisto é uma excelente frase, sem explicações, simplesmente um imprevisto, ok".
(...) Mais um zazen, ô parede IN-SU-POR-TÁ-VEL. Blá blá blá blá blááá. Sino, please. Sinooooo. Buda, você me paga, te pego lá fora. Ardilosa, a mente tentava de todo jeito se manter no comando como ela sempre fez, falando, falando, falaaaando. Ai, estou com vontade de gritar, de chorar, quero mexer minha perna, ai minhas costas, maldita dor no meio das costas. Ainda faltam dois dias. Caramba, dois dias. O que significa mais 25 zazens, contando com as que restam hoje. Om om om, blá blá blá. Toca o sino, que inferno.
(...) Quarto dia. Algo aconteceu. Eu pensei tanto, mas tanto, que acho que esgotei todos, quer dizer, quase todos, os pensamentos. Primeiro zazen do dia...aaahhhhh, que maravilha. Mente quieta, coluna ereta, o coração tranquilo. Oi, parede. Te amo! Buda, você é tudo.
Aiai silencio ........................................... nossa, mas se eu não pensar, vou fazer o que então? Quase não estou pensando, mas se eu não pensar vou ser o quê, vou fazer o quê? "Abra mão dos pensamentos". Nenhum om sequer. Nada...ai que gostoso ........................................ é isso, é isso! Simplesmente Ser, estar, sem julgar, sem comparar, sem questionar, sem objeto de concentração, sem me sabotar, sem me culpar, sem achar que sou isso ou sou aquilo ........................................ Segundo zazen: aiai ........................................... Terceiro e último zazen do retiro: .............................................. que maravilha, que retiro maravilhoso, por que a gente sofre tanto com os nossos pensamentos? Para onde eles nos levam, o que conseguimos pensando tanto, para quê? Por que nos identificamos tanto com os nossos pensamentos? Por que não conseguimos simplesmente Ser?
(...) Agora é que vem o grande desafio. Cultivar o zazen sozinha, sem a sangha (comunidade), sem o grupo. Sentar. Ser. Simplesmente sentar e Ser. Um pouco todo dia, um sadhana, uma prática. Só sentar. De frente para a parede. Simples assim, difícil assim. Transformador assim.

(Veja o texto completo aqui)

sábado, 24 de julho de 2010

Lição de alegria

Hoje vivi a minha própria versão do Pequeno Príncipe.
Ao invés do deserto, o cenário era a praia. Manhã cinzenta de chuva e vento frio. Fui até o mar para deixar as pernas imersas na água, verdadeira salmoura. A praia estava praticamente vazia. Na beira da água, uma menina brincava sozinha enquanto a mãe, afastada, conversava com uma senhora. Após meia hora de terapia, quando me preparava para partir, uma vozinha me chamou. Ela não me pedia que lhe desenhasse um carneiro, mas fazia um convite: "Moça, quer enterrar os pés na areia comigo?". Fui para o raso. "A gente não precisa fazer nada, é só deixar o mar cobrir nossos pés". A sensação era de alegria gratuita, a infância mais perto que nunca. "Agora vamos pular onda?". Expliquei que não podia e mostrei os joelhos machucados. "Onde você fez isso?"."Caí de bicicleta."."Você não sabe andar de bicicleta? Então tem que usar rodinha." Ela pulava e eu afundava os pés. Cada onda era um riso. "Posso segurar a sua mão?" Ela pulava ondas maiores e se apoiava em mim. De repente parava, abria bem os braços e fazia uma inspiração profunda. "Agora vamos apreciar a praia". A pequena yoguini me ensinava mais que os livros de filosofia. Uma japonesinha de seis anos de idade, risada de guiso de estrela, olhos verde-escuros, da cor do mar. Marina, o nome dela. Apreciamos a praia, os navios ao longe, a promessa de sol e a faixa azul do céu limpo lá na linha do horizonte, os pássaros pertinho - "tá vendo?" -, o vento no rosto - "tá sentindo?". Tudo era bom. Estar ali, reconhecer cada coisa que se movia e encontrar prazer nisso eram a diversão e a aprendizagem. Ela me contou, como se fosse a coisa mais natural do mundo, que sabia voar. Tinha asas imaginárias. Uma onda mais forte e num impulso ela pulou no meu colo. Nem me importei por ela estar toda molhada e eu morrendo de frio. Brincamos mais de mar e fizemos mais um amigo, Giovani. "Agora vamos fazer castelo?", "Vamos, mas eu não posso me abaixar.","Você vai ser a juíza e me dizer se o meu castelo está bom.". Acabou fazendo macarrão. Não, era arroz e feijão. Ensinei a fazer castelo de gotinhas. "Parece um bolo de chocolate.". Conversamos sobre bolinho de chuva. Uma hora inteira de brincadeira. O vento soprava mais forte e finalmente ela admitiu que estava com frio. Decidimos ir embora, sem tristeza alguma na despedida, apenas gratidão.
Antes de começar a escrever esse texto, abri meu email e encontrei essa frase do Guimarães Rosa, enviada hoje por minha irmã:

"Deus nos dá pessoas e coisas, para aprendermos a alegria... Depois, retoma coisas e pessoas para ver se já somos capazes da alegria sozinhos... Essa... a alegria que ele quer."

Agradeço o presente. E agradeço à Marina, menina dos olhos da cor do mar, pela lição de alegria.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

A queda

Hoje fiz a coisa mais patética da minha vida. Já fiz muitas coisas patéticas, mas acho que consegui me superar. Caí de bicicleta! Ainda não sei exatamente como, mas do que eu consegui racionalizar da situação, resvalei numa tartaruga, escorreguei e caí. Feio! Provalmente, este foi o tombo mais idiota da história dos tombos. Uma pessoa sozinha, completamente sozinha, atropelar uma tartaruga e cair no meio da rua. Sorte não estar passando nenhum carro.
Uma cena de comédia pastelão materializada em plena avenida da praia! Para minha surpresa, não fiquei com vergonha. Sempre pensei que o pior das quedas é a vergonha de cair, mas a sensação foi de raiva misturada com um ímpeto de auto-superação. Devo ter acompanhado demais o Tour de France - que sempre tem aquelas cenas incríveis de acidente, e os ciclistas sempre continuam -, porque ainda no chão, só conseguia pensar "levanta e anda!". E foi o que eu fiz. Ainda na esquina de casa, poderia ter voltado. Mas não. Segui meu caminho. Ao dar as primeiras pedaladas, senti muita dor e pensei que o negócio poderia ser feio, e por um breve instante, me deu uma vontade infantil de chorar. Passou logo.
De repente, a única coisa verdadeira que eu sentia era dor. Não tinha mais raiva, nem auto-piedade nem necessidade de consolo. Não precisava correr para alguém para mostrar os machucados, fazer beicinho e pedir pra assoprarem na hora do methiolate. Apenas eu e minha dor. E pode parecer loucura, mas isso me fez um bem enorme. Reconheci concretamente a minha capacidade de cair e levantar!
Ao chegar ao meu destino, avaliei as consequências do meu momento de epifania. Os dois joelhos esfolados e muito machucados. E dor, muita dor. Como um tombo tão besta foi capaz de fazer um estrago tão grande?
Na hora do banho, mais dor, e finalmente dei o braço a torcer, admitindo que a revelação poderia ter vindo de uma forma mais branda. Mas mesmo agora, com a dor intensificada e as articulações comprometidas, valorizo a experiência e relembro a passagem de Grande Sertão: Veredas, que eu repetia como um mantra durante todo o trajeto, com um sorriso no rosto e um certo orgulho:

"Todo caminho da gente é resvaloso. Mas, também, cair não prejudica demais - a gente levanta, a gente sobe, a gente volta!"

domingo, 18 de julho de 2010

On the road

Finalmente, consegui ler On the road (Pé na estrada), de Jack Kerouac, um dos principais representantes da geração beat. A leitura supera qualquer coisa que se possa dizer sobre o livro. A sensação que fica é a do desejo de viver a loucura que é ser humano, guiado por uma fome insaciável de vida e pelo compromisso único de se tornar realmente autêntico.

"Eles percorriam as ruas juntos, sacando tudo com aquele jeito que tinham nesses primeiros anos, e que mais tarde se tornaria mais amargurado, penetrante e vazio. Mas, nessa época, eles dançavam pelas ruas como peões frenéticos, e eu me arrastava na mesma direção como tenho feito toda a minha vida, sempre rastejando atrás de pessoas que me interessam, porque, para mim, pessoas mesmo são os loucos, os que estão loucos para viver, loucos para falar, loucos para serem salvos, que querem tudo ao mesmo tempo, aqueles que nunca bocejam e jamais dizem coisas comuns, mas queimam, queimam, queimam como fabulosos fogos de artifício, explodindo como constelações em cujo centro fervilhante - pop - pode-se ver um brilho azul e intenso até que todos 'aaaaaaah!'"

"A única coisa pela qual ansiamos em nossos dias de vida, e que nos faz gemer e suspirar, sujeitos a todos os tipos de dóceis náuseas, é a lembrança de uma alegria perdida, provavelmente experimentada no útero, e que somente poderá ser reproduzida (apesar de odiarmos admitir isso) na morte. Mas quem quer morrer?"

"Amarguras, recriminações, conselhos, moralidade, tristeza - tudo lhe pesava nas costas, enquanto à sua frente se descortinava a alegria esfarrapada e extasiante de simplesmente ser."

"Relembrávamos essas coisas todas e suávamos. Tínhamos nos esquecido totalmente das pessoas sentadas à frente, e elas começaram a se perguntar o que estava se passando no assento traseiro. A certa altura, o motorista falou: - Pelo amor de Deus, vocês estão fazendo o carro balançar aí atrás. - E estávamos mesmo! O carro oscilava de um lado para outro, enquanto Dean e eu balançávamos no mesmo ritmo, e AQUILO era nossa alegria excitada e derradeira, a alegria que tínhamos de falar e viver, e que nos conduzia em direção ao transe definitivo e vazio de todas as inumeráveis partículas cerimoniais e angélicas que haviam estado soterradas no fundo de nossas almas toda a vida.
- Ah, homem! homem! homem! - balbuciou Dean. - E isso é apenas o começo... agora finalmente estamos juntos, indo para o leste, nunca tínhamos ido para o leste juntos, Sal, pense nisso, vamos curtir Denver juntos e ver o que todos estão fazendo, mesmo que isso não nos interesse muito, a questão é que nós sabemos o que AQUILO significa, e sacamos a VIDA e sabemos que tudo está ÓTIMO. - Depois, puxando-me pela manga e suando, ele me segredou: - Agora dê uma olhada nesse pessoal aí na frente. Estão preocupados, contando os quilômetros, pensando onde irão dormir esta noite, quanto dinheiro vão gastar em gasolina, se o tempo estará bom, de que maneira chegarão aonde pretendem... e, quando terminarem de pensar, já terão chegado aonde queriam, percebe? Mas eles têm que se preocupar e trair seus horários, cada minuto e cada segundo, entregando-se a tarefas aparentemente urgentes, todas falsas, ou então, a desejos caprichosos angustiados e angustiantes; suas mentes jamais descansam , não encontram paz, a não ser que se agarrem a uma preocupação explícita e comprovada, e, depois de encontrar uma, assumem expressões faciais adequadas, graves e circunspectas, e seguem em frente, e tudo isso não passa, você sabe, de pura infelicidade, e durante todo esse tempo a vida passa voando por eles, e eles sabem disso, e isso também os preocupa, num círculo vicioso que não tem fim."

***

Aproveito pra agradecer meu amigo Alexandre Moreira, que me emprestou o livro, apesar do risco declarado que corria de não mais rever seu exemplar. Gostei da prática adotada pelo Sr. Moreira de permitir que seus amigos deixem um recado na folha de rosto do livro, com uma mensagem, o nome e a data do empréstimo. Chamou minha atenção o recado de um amigo em comum, Daniel Alexandrino, antigo companheiro de debates literários. Tomo a liberdade de reproduzi-lo aqui:

"'On the Road' é... é... REVITALIZANTE, a palavra é esta. Apesar de parecer adjetivo próprio de shampoo, desta vez, tomo-a emprestada e qualifico um livro. Valeu Moreira!! (atual dono do livro; depois do famoso e público 'furto do sebo', em 95). Muito rica a leitura!! Daniel. 05/98"

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Futebol

Meninos jogando bola na rua depois da derrota
do Brasil pra Holanda.
O entusiasmo e os gritos de gol destoam da tristeza do dia.
Isso é Brasil: a seleção perde, o futebol continua.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Muito mais que um desenho

Quem já viu a animação Avatar: a lenda de Aang, compreende o título da postagem.
Inspirado em filosofias orientais, Avatar é uma grande alegoria, em forma de desenho animado, do caminho de transcendência do homem e do universo. E isso não é interpretação exagerada ou forçada.
A série conta as aventuras de Aang, o último Avatar, que tem como missão salvar o mundo. A grande questão - e o maior atrativo do enredo - é que Aang é apenas um menino que, além de ter essa obrigação com a humanidade, se vê às voltas com a necessidade de crescer e se tornar o Avatar.
"O Guru" - 19º episódio do segundo livro (A série é dividida em livros, em que cada capítulo é um episódio) - é bastante emblemático dessa proposta de filosofia por trás (ou por meio) de desenho. Nesse capítulo, Aang vai em busca do Guru que vai lhe ensinar a ter o controle do estado de Avatar. Para isso, ele deve aprender a ter equilíbrio, antes de levar equilíbrio para o mundo (soa familiar?). A lição: libertar os chakras.
"Há sete chakras em nosso corpo. Cada poço de energia tem um propósito e pode ser bloqueado por um tipo específico de bloqueio emocional. Um aviso: abrir os chakras é uma experiência intensa e quando começa o processo, você não pode parar até os sete estarem abertos. Você está pronto?"
A partir daí, junto com as tramas paralelas do capítulo, Aang vai liberando cada um dos seus chakras.
Terra, a sobrevivência, bloqueado pelo medo. Água, o prazer, bloqueado pela culpa. Fogo, a força de vontade, bloqueado pela vergonha, a decepção conosco. Coração, o amor, bloqueado pela dor. Som, a verdade, bloqueado pelas mentiras que contamos a nós mesmos. Luz, discernimento, bloqueado pela ilusão. Pensamento, a energia cósmica, bloqueado pela ligação terrena. Por fim, a libertação. E a surpresa do capítulo.
Para além do caráter quase didático do episódio, destacam-se, enquanto desenho, as criações visuais das representações mentais e emocionais de Aang. Cada chakra tem sua cor e os bloqueios interiores de Aang são extremamente significativos e ligados ao restante da trama.
Ao final do capítulo, fica a vontade de ler o livro inteiro.

Para quem quiser "ler" ou conhecer mais, o site Mundo Avatar tem todos os episódios, além de dados e curiosidades sobre a série. O textos "Avatar: um bodisatva não é um lenda" e "Avatar: o último dominar das delusões", de José Benetti, falam sobre a relação entre o desenho animado e os ensinamentos budistas.
A série de animação também ganhou uma versão cinematográfica pelas mãos de M. Night Shyamalan, o mesmo diretor de Sexto Sentido.
O filme deve estrear no Brasil em agosto.

domingo, 20 de junho de 2010

Star Star

(Glen Hansard)

Star star teach me how to shine shine
Teach me so I know what's going on in your mind
'Cause I don't understand these people
Who say the hill's to steep
Well they talk and talk forever
But they just never climb

Falling down into situations
Bringing out the best in you
You're flat on your back again
And star you're ever word I'm heeding
Can you help me to see
I'm lost in the marsh

Star star teach me how to shine shine
Teach me so I know what's going on in your mind
'Cause I don't understand these people
Who say we're all asleep
They'll toss and turn forever
But no rest will they find...



Versão com a Marketa Irglova: The Swell Season

sábado, 19 de junho de 2010

A redescoberta do twitter

Tinha criado minha conta no twitter por pura obrigação. Tarefa de Jornalismo Online. Deixei lá. Um ano depois, retomei. Cansei. Deixei pra lá. Pouca paciência para dizer o que estou fazendo. Com o perdão dos meus amigos, também não estava interessada em ter conhecimento de quem está indo pra tal balada, falando não sei o quê para não sei quem, ou fazendo sei lá o quê.
Mas, graças ao Igor Petrovich (que ultimamente anda me apresentando coisas muito interessantes...), descobri um jeito gostoso de usar o twitter. Ele me sugeriu seguir o Glen Hansard, músico irlandês que participou do filme "Apenas uma vez" (um dos meus favoritos!).
Entre os tweets do Hansard, encontrei coisas como "The only way to keep something is with an open hand" e "First they ignore you, then they laugh at you, then they fight you, then you win." (Mahatma Gandhi), além de indicações de livros, filmes e músicas. Adorei.
Redescobrindo o twitter, procurei algumas pessoas que admiro e encontrei mais bons motivos para retomar essa rede econômica de relacionamentos. Millôr Fernandes, Alice Ruiz, Rubem Alves... a busca continua...

Algumas delícias de tweets:

"Responda depressa: o que é que faz quem não gosta de fazer nada e morre de tédio por não ter o que fazer?"
(Millôr Fernandes)

"O que você tem feito? Tem feito a cabeça, as ideias. Os sonhos de alguém?"
"A vida voa sem asas, a vida passa de graça."
"Atenção: Essa vida contém cenas explícitas de tédio. Nos intervalos da emoção."
(Alice Ruiz)

"Como são diferentes as mãos ternas das mãos que desejam posse! A ternura não deseja nada."
(Rubem Alves)

Também encontrei a Mafalda, do Quino:

"Hoje meus amigos e eu decidimos brincar de governo. Não fizemos absolutamente nada."
"O grande problema da família humana é que todos querem ser o pai."
"Mamãe disse que estamos no mundo para trabalhar, nos amar e fazer deste mundo um mundo melhor. Não sabia que ela tinha tanto senso de humor!"
"'A bondade é natural no homem'... E a maldade deve ser de alguma dessas fibras artificiais que estão em moda no mundo inteiro."
"Às vezes vocês não se sentem um tanto indefinidos? "
"Como vamos a entender a los adultos, si cuando nosotros llegamos, ellos ya estaban todos empezados!"
"Como siempre: lo urgente no deja tiempo para lo Importante."

domingo, 6 de junho de 2010

Loucos e Santos

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila.
Têm que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.
A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos.
Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo.
Deles não quero resposta, quero meu avesso.
Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.
Para isso, só sendo louco.
Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.
Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta.
Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria.
Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto.
Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade.
Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.
Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça.
Não quero amigos adultos nem chatos.
Quero-os metade crianças e outra metade velhice!
Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa.
Tenho amigos para saber quem eu sou.
Pois os vendo loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

sábado, 13 de março de 2010

Crítica ou resenha?

Na última aula de Jornalismo Online, descobri que não sei escrever crítica de cinema. Como assim? Eu, que adoro filmes, não sei escrever sobre eles? Escrever, até sei - ou acho que sei. Mas não é crítica, é resenha. A diferença? Boa pergunta! O choque da revelação e a urgência de ter que elaborar uma crítica em uma hora me fizeram fazer, sem saber exatamente como fazer.
A título de ilustração, publico aqui a resenha e a crítica.

Peixe Grande

O cinema é a arte de contar histórias por meio de imagens em movimento. Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas, de Tim Burton, traduz bem essa arte.
William Bloom, jornalista norte-americano vivendo em Paris, volta à cidade natal para rever o pai, paciente terminal de câncer. Os dois não se falavam há três anos, por conta de uma incompatibilidade essencial: o pai vivia contando histórias, o filho já não queria ouvi-las. Agora sua última narrativa seria a da própria morte.
Quando criança, Edward Bloom viu o modo como iria morrer nos olhos de uma bruxa - conhecimento que o libertou do medo de outras ameaças. "Se você sabe como vai morrer, pode sobreviver a qualquer coisa."
Viver e narrar o fim é a última grande aventura, e a busca de William pela linha que separa os fatos da ficção e o homem do mito acaba levando-o à descoberta de quem realmente é o seu pai.
Edward Bloom é um contador de histórias. Sua vida, plena de acontecimentos mirabolantes e personagens memoráveis, girava em torno de uma lenda: a do peixe grande. O ser inalcançável simbolizava a busca incansável. "O maior peixe do rio fica desse tamanho porque nunca é pego". Ambição, perseverança e astúcia levam Edward à jornada de se tornar maior que si mesmo.
História do Gigante. História da partida, da estrada desconhecida e de Spectre, a cidade perfeita. História do circo e do encontro com a garota do seu destino. História do grande amor. História da guerra e das gêmeas cantoras. Histórias de caixeiro-viajante e do assalto ao banco. História da destruição e reconstrução de Spectre. Jennifer Hill e a história da fidelidade. A história final.
Histórias ou mentiras? A rendição do filho ao encanto das lendas do pai acontece também em forma de narrativa. William assume a narração de como Edward vai morrer. Os papéis se invertem. O filho conta uma história para o pai. "Você se torna o que sempre foi: um peixe grande. E é assim que acontece".
Peixe Grande é a história de um reencontro, de aceitação e descoberta - a incrível jornada de tornar-se quem se é.

Superação sem clichês

Filmes de superação formam um filão lucrativo na indústria cinematográfica. Roteiros melodramáticos, trilha sonora tocante e astros carismáticos garantem lágrimas e a sensação de se ter tido uma “lição de vida” ao sair da sala. O Jardim Secreto, Jack¸ Meu Nome é Rádio, À Espera de um Milagre, Um Prova de Amor - a lista pode seguir infinitamente. Filmes que conquistaram espaço nos corações de espectadores em todo o mundo, mas não são, necessariamente, uma obra de arte. Apenas entretenimento. Tire todos os ingredientes da receitinha hollywoodiana convencional, e será que ainda é possível um belo filme de superação? O Escafandro e a Borboleta mostra que sim.
Lançado em 2007, o filme é baseado em uma história real. Jean-Dominique Bauby (uma interpretação memorável de Mathieu Amalric) tem 43 anos, é um famoso editor da revista Elle e um reconhecido bon vivant. Após sofrer um derrame cerebral, Bauby passa a viver em uma cama de hospital, tendo que enfrentar uma paralisia rara, que lhe permite apenas o movimento do olho esquerdo. A limitação o obriga a aprender a se comunicar piscando o olho. De letra em letra, ele forma palavras, frases, um livro. Sua obra é expressão do mundo que criou para sobreviver.
O roteiro, assinado por Ronald Harwood, é baseado no livro autobiográfico de Jean-Dominique Bauby. A fidelidade ao texto original é garantida por conta do recurso da narração em off feita pelo personagem principal. Seria clichê, se não fosse a direção primorosa de Julian Schnabel. A escolha dos ângulos e os movimentos de câmera acompanham o olho esquerdo de Bauby, garantindo cenas ora poéticas, ora angustiantes. A originalidade do recurso acerta em cheio e comove, sem sentimentalismo barato.
Não à toa, Schnabel, diretor de Basquiat - Traços de uma vida (1996) e Antes do Anoitecer (2000), levou em 2008 dois Globos de Ouro (melhor filme estrangeiro e melhor direção), o prêmio de melhor diretor e o Grande Prêmio Técnico no Festival de Cannes. Além disso, O Escafandro e a Borboleta foi indicado ao Oscar nas categorias melhor diretor, fotografia, edição e roteiro adaptado.
O filme é, sim, uma lição de vida. Mas acima de tudo é uma grande lição de cinema.

domingo, 10 de janeiro de 2010

A delícia de ser um corpo

Aprender a tocar é aprender a sentir. A mão que desliza encontra o limite do corpo do outro que se entrega. E deixar-se tocar é mesmo isso: um exercício de entrega. E de libertação. O verdadeiro toque é um encontro de duas liberdades. Toda indiferença do toque rotineiro e já mecanizado pelo hábito desaparece. As mãos deixam de ser levianas pois sabem que o encontro de dois corpos exige a reverência e o respeito que se tem ao entrar-se em um templo.
Aula de Yoga Massagem. Uma experiência verdadeiramente sensual, no sentido de envolver todo o corpo e os sentidos. E espiritual, por exigir o Ser. Encontro sutil de duas energias. O prazer de sentir-se tocado renovando-se no momento de tocar. Exercício de presença. E mais uma oportunidade de experimentar a delícia de ser um corpo.