terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Sem melodia

Há pessoas nas quais um constante repousar em si mesmas e uma harmoniosa disposição das faculdades são tão próprios, que lhes repugna qualquer atividade dirigida para um fim. Eles semelham uma música que consiste apenas em acordes harmônicos sustentados por longo tempo, sem mostrar sequer o início de um movimento melódico articulado. Toda movimentação vinda de fora serve apenas para dar imediatamente a seu barco um novo equilíbrio, no lago da consonância harmônica. Em geral as pessoas modernas ficam muito impacientes, ao se defrontar com essas naturezas que nada se tornam, sem que delas se possa dizer que nada são. Mas há estados de espírito em que a sua visão desperta a pergunta inusitada: para que melodia, afinal? Por que não nos basta que a vida se espelhe quietamente num lago profundo? - A Idade Média era mais rica em tais naturezas do que o nosso tempo. Como é raro ainda encontrarmos alguém capaz de seguir vivendo de maneira pacífica e alegre consigo também no torvelinho, dizendo a si mesmo as palavras de Goethe: "O melhor é a calma profunda em que diante do mundo eu vivo e cresço, e adquiro o que não me podem tirar com o fogo e com a espada".

(Humano, demasiado humano, Friedrich Nietzsche)


Um comentário:

Adriana Antolin disse...

Olha você aí... uma rara pessoa 'capaz de seguir vivendo de maneira pacífica e alegre consigo também no torvelinho, dizendo a si mesmo as palavras de Goethe: "O melhor é a calma profunda em que diante do mundo eu vivo e cresço, e adquiro o que não me podem tirar com o fogo e com a espada".'
E, sem egoísmo, divide os ensinamentos do simples, orientando quem quiser se encontrar. O mundo está para todos, basta sabermos enxergar. Obrigada por sempre me abrir os olhos!!! Por mais que eu tente cerrá-los...