quarta-feira, 10 de abril de 2013

Clube da luta

O mecânico grita pela janela:
Se você estiver no clube da luta, tanto faz o dinheiro que tenha no banco. Você não é o que faz para viver. Você não é a sua família e não é quem pensa que é.
O mecânico grita para o alto:
— Você não é o seu nome.
Um macaco espacial sentado no banco de trás emenda:
— Você não é os seus problemas. O mecânico grita:
— Você não é os seus problemas. Outro macaco espacial diz:
— Você não é a idade que tem.
Neste ponto, o mecânico dá uma guinada na direção e sai para o acostamento e a luz dos faróis entra pelo pára-brisa com a frieza de uma punhalada. Um carro e depois outro passam buzinando, e o mecânico desvia dos dois a tempo.
Os faróis nos atingem, cada vez mais fortes, as buzinas tocam, e o mecânico estica o pescoço para o clarão, o barulho e os gritos:
— Você não é suas esperanças. Ninguém ouve nada.
Desta vez, um carro desvia bem na nossa frente e estamos salvos.
Outro carro se aproxima, faróis piscando, alto, baixo, alto, baixo, buzina berrando, e o mecânico grita:
— Vocês não se salvarão.
O mecânico não desvia, mas o outro carro sim. Outro carro, e o mecânico grita:
— Vamos todos morrer um dia.
Desta vez, o carro desvia, mas o mecânico vai para cima dele. O carro consegue sair de lado e para mais à frente, outra vez.
Nessa hora, você acha que vai morrer. Porque nesse momento nada importa. Olha para as estrelas e desaparece. Nem sua bagagem. Nada importa.
Nem a sua dificuldade de respirar. Está escuro la fora e as buzinas tocam ao redor. Os faróis piscam na sua cara e você nunca mais terá de ir trabalhar.
Nunca mais terá de cortar o cabelo.
— Rápido — diz o mecânico.
O carro desvia de novo, e o mecânico desvia junto.
— O que você gostaria de fazer antes de morrer? — pergunta o mecânico.
Um carro se aproxima buzinando, mas o mecânico, com toda a calma, vira-se para mim e diz:
— Dez segundos para o impacto.
— Nove.
— Em oito.
— Sete.
— Em seis.

(Clube da luta, Chuck Palahniuk)



(Um filme tão bom quanto o livro, e vice-versa. Ler o livro e ver o filme — ou ver o filme e ler o livro. Nesse caso, a ordem dos fatores não altera o produto)

terça-feira, 2 de abril de 2013

Einstein - sua vida, seu universo

      "Nunca cessamos de nos comportar como crianças curiosas perante o grande mistério em que nascemos." (Albert Einstein)

"'Prometo-lhe quatro artigos', o jovem examinador de patentes escreveu ao amigo. A carta anunciava algumas das novidades mais significativas da história da ciência, mas sua extrema importância foi mascarada pelo tom travesso que era típico de seu autor. Afinal, ele acabara de chamar o amigo de 'baleia congelada', e se desculpara por escrever uma carta que não passava de 'tagarelice inconsequente'. Só quando chegou ao ponto em que descrevia os artigos, preparados em suas horas vagas, deu indicações de que compreendia a transcendência deles. 'O primeiro trata da radiação e das propriedades energéticas da luz, e é muito revolucionário', explicou. Claro, era realmente revolucionário. Argumentava que a luz poderia ser considerada não só como onda, mas também como uma corrente de minúsculas partículas chamadas quanta. As implicações que sua teoria acabaria provocando - o cosmos sem causalidade ou certeza estrita - iriam assombrá-lo pelo resto da vida. 'O segundo artigo é uma determinação do verdadeiro tamanho dos átomos.' Muito embora a própria existência do átomo ainda fosse debatida, aquele era o mais direto dos artigos, por isso ele o escolheu como a melhor opção para sua mais recente tentativa de tese de doutorado. Estava começando a revolucionar a física, mas fora repetidamente desencorajado em seus esforços de obter uma posição acadêmica ou mesmo o título de doutor, que, esperava, iria promovê-lo de examinador de terceira classe para examinador de segunda classe no escritório de patentes.
O terceiro artigo explicava o movimento em ziguezague das partículas microscópicas em líquidos usando uma análise estatística das colisões aleatórias. Acabou comprovando que átomos e moléculas realmente existiam.
'O quarto artigo não passa de um esboço a esta altura, e é uma eletrodinâmica dos corpos em movimento que emprega uma modificação da teoria do espaço e do tempo.' Bem, isso era sem dúvida muito mais que tagarelice inconsequente. Baseado puramente em experimentos mentais - realizados em sua cabeça, e não no laboratório -, ele decidiu descartar os conceitos de espaço e tempo absolutos de Newton. Isso se tornaria conhecido como teoria da relatividade especial.
O que ele não disse ao amigo, pois ainda não lhe ocorrera, foi que produziria um quinto artigo naquele ano, um pequeno adendo ao quarto artigo, em que postulava uma relação entre energia e massa. Dele surgiria a equação mais conhecida de toda a física: E = mc².
Ao examinar em retrospecto um século que será lembrado por sua disposição em romper com conceitos clássicos, e ao olhar adiante, para uma era que busca nutrir a criatividade necessária à inovação científica, vemos que uma pessoa se destaca como supremo ícone de nossa época: o gentil refugiado da opressão, de cabelo despenteado, olhos vivos, benevolência sedutora e inteligência extraordinária cuja face se tornou um símbolo e o nome um sinônimo de genialidade. Albert Einstein era um serralheiro abençoado pela imaginação e guiado pela fé na harmonia das obras da natureza. Sua história fascinante, um testemunho do vínculo entre criatividade e liberdade, reflete os triunfos e tumultos da era moderna.
Agora que seus arquivos foram totalmente abertos, é possível investigar como o aspecto pessoal de Einstein - a personalidade não conformista, o instinto rebelde, a curiosidade, a paixão, os desinteresses - interligavam-se com seus lados político e científico. Conhecer o homem ajuda-nos a compreender as fontes de sua ciência, e vice-versa. Personalidade, imaginação e gênio criativo estão relacionados, como se formassem um campo unificado.
(...) Tanto em seus trinta anos de revolucionário como nos trinta anos subsequentes como antagonista, Einstein permaneceu coerente em sua postura de solitário serenamente fascinado que se sentia confortavelmente não conformista. Pensador independente, vivia estimulado por uma imaginação que rompia o confinamento da sabedoria convencional. Ele era a figura singular, o rebelde respeitoso guiado por uma fé que alimentava ligeiramente, com uma piscadela de olho, num Deus que não jogava dados permitindo que as coisas acontecessem por acaso."

(Einstein - sua vida, seu universo, Walter Isaacson)